terça-feira, 30 de junho de 2009

A Revolução de Maio

































EXCERTOS DO FILME A CONSIDERAR:


O filme tem um personagem omnipresente que passa por ser a acção da polícia que, no nosso entender, simboliza o próprio regime politico – o Estado Novo –, que tudo controla e tudo vê, a própria ordem dos regimes de direita. A personagem imprime o carácter ditatorial ao regime e ao filme, pois não existe uma visão plural e democrática. A visão plural é nos dada no princípio do filme em que surge César Valente, sujeito subversivo que quer trazer novos ventos a Portugal, e a polícia do regime que procura combater esse mal, porém aguarda que as alterações que aquele observa na sociedade sejam suficientes para que César Valente se submeta ao regime e concorde com o projecto de uma revolução continuada, tendo o seu princípio em 28 de Maio de 1926. Ambas as visões são complementares para que a história funcione, o caos procura destronar a ordem, porém a ordem vence e absorve os radicais ao regime. Pois o filme retrata o Estado Novo nas suas virtudes inquestionáveis.
00.00 – 4.00 – Europa em guerra, instabilidade, Portugal em paz.

26.40 – 37.34 – Tipografia "Liberdade" onde funciona a base dos subversivos; recebem mensagens por código morse e fazem jornais clandestinos.

Diálogos: a revolução quer espelhar-se numa classe que não quer uma insurreição mas antes revolução que conduzirá à mudança; pretendem com a revolução neutralizar a data de 28 de Maio, data do golpe militar de 28 de Maio de 1916 que colocou fim à experiência republicana em Portugal; evidência a forma como se organiza a revolução e como funciona o boato no meio cultural português, onde vigora a censura, esta realiza o controle da informação que deve vir a publico.

37. 34 – 39.15 – Mostra as obras do Estado Novo: os novos bairros, sinonimo de melhores condições de vida; o Instituto Superior Técnico e o Instituto Nacional de Estatística (INE), obras, que como são mostradas ao espectador revelam a sua opulência e grandiosidade, dada a pequenês do homem, sobretudo quando César Valente entra no INE.

39.30 – 46.08 – Passa uma relação estatística que invariavelmente é introduzida, de forma cómica, pelo personagem Barata e o seu interlocutor. Os temas são o desemprego, Portugal possui 0,6% relativamente à Europa é o mais baixo; seguem-se outras estatísticas relativas ao ensino, plantação de árvores; a economia, com a explorações de conservas, o término com a "divida flutuante", a baixa de juros, o aumentos das poupanças, tudo comparado com o existente em 1926 e 1933.

59.32 – 1.02.10 – A importância da rádio para ocupar os tempos livres da população e como se fazia nos anos 30, rádio com artistas ao vivo.

1.11.42 – 1.16.17 – Métodos policiais; a polícia tem informações de todos os cidadãos.

1.17.00 – 1.20.40 – Obras do porto de Leixões.
1.36.06 – 1.42.32 – Festejos do primeiro de Maio no norte do país, trata-se de um desfile etnográfico em que evidencia o outro lado do Portugal da época, vocacionado para a ruralidade. Pode-se apelar aos alunos para mostrarem os contrastes de desenvolvimento de Lisboa e do resto do país. Nesse cortejo surgem cartazes com chavões do Estado Novo: surge primeiro "Fortuna" seguido do "Corporativismo"; outro mostra que "a verdade tem o seu brilho, a justiça tem o seu peso"; o epítome mais comum do Estado Novo "Tudo pela Nação, nada contra a Nação"; surge a cruz que foi usada como símbolo durante a vigência do Estado Novo; e, por fim, "ordem, trabalho em prol de Portugal".

1.44.01 – 1.46.30 – Maria Clara questiona e pede a César Valente para deixar viver em paz os outros e não espalhar o seu mal à sua volta. César Valente começa a ter dúvidas sobre os benefícios da revolução, que simboliza a mudança, mas incerta; olha ao redor, sobre Lisboa, como se desenvolveu, com o barulho de fundo de alegria das crianças de uma escola primária.

1.47.28 – 1.54.15 – Imagens da tipografia "Liberdade". Canta-se uma canção enquanto pegam e admiram as armas a usar na revolução. O protagonista traduz a letra da canção para os demais, cujo significado é revelador que a revolução não leva a nada só estraga o sonho e a obra feita, neste caso deve ler-se a obra mostrada ao longo do filme do estado Novo. A bandeira que César Valente deve colocar no local mais alto da cidade de Lisboa, como sinal do início da revolução, é vermelha – terá conotação comunista? A seguir mostra a acção da policia para prender os insurrectos.

1.54.15 – 2.00.05 – Reflexão de César Valente se colabora com a revolução ou não. Surgem imagens de uma hipotética guerra civil. Quando é erguida a bandeira de Portugal, César Valente, tira o chapéu em sinal de respeito, sinal que se converteu à causa do Estado Novo.

2.00.14 – 2.12.22 – Mostra-se a comemoração dos dez anos do 28 de Maio, celebrações realizadas em Braga. Surgem as figuras históricas do regime Óscar Carmona, Presidente da República, e António de Oliveira Salazar. Ouvem-se palavras de ordem como "Queremos Salazar" e lê-se "A revolução contínua". Dês seguida a população e os militares desfilam junto ao palanque em que estão as figuras do Estado. Pouco depois ouve-se o discurso de Salazar que se poderia intitular "o início de uma nova era" cujas palavras fortes são " não discutimos Deus e a virtude, não discutimos a pátria e a sua História, não discutimos a autoridade e o seu prestígio, não discutimos a família e a sua moral, não discutimos a glória do trabalho e o seu dever" que simbolizam os pilares em que assentou a edificação do Estado Novo. Quase a finalizar o filme Barata surge mais um companheiro no café e ouve-se a dizer "Agora é que o país vai entrar nos eixos".


Justificação da escolha do filme e porque motivo irá ser passado na íntegra com enfoque para os excertos seleccionados.


O filme é um exemplo de propaganda ao regime e não esconde esse princípio, logo no início surgem as imagens retiradas de documentários e fornecidas pelas entidades o Secretariado da Propaganda Nacional e o Ministério da Agricultura. Todavia não deixa de ser visado pela Inspecção Geral dos Espectáculos – leia-se censura.

É um filme que retrata época e as vivências quotidianas em que surgiu o Estado Novo. Pela a análise dos excertos atrás referenciados mostra-se todas os princípios ideológicos do regime fascista português: a ruralidade, a pátria é inquestionável, o corporativismo, o trabalho, a família, a presença de Deus…

O filme – Revolução de Maio – deve ser mostrado na integra em virtude da história por trás da propaganda, caso contrário não se entende essa dimensão. Assim, retrata-se a história do amor que nasce entre Maria Clara e César Valente e as mudanças ideológicas que esta última personagem tem ao verificar as alterações introduzidas, no espaço de dez anos do novo regime político.


Contexto da projecção e exploração do filme e objectivos e avaliação


No 9º ano de escolaridade, dado a limitação de tempo para proceder à execução dos conteúdos programáticos teriam de ser passados os excertos seleccionados, que pensamos não desvirtuar a história do filme. O visionamento dessa forma iria permitir interrupções para esclarecimentos adicionais, fazer ligações com os conteúdos a leccionar, aproveitar-se-ia para introduzir a análise documental do manual adoptado e originar debate na sala de aula. Uma ficha detalhada de visionamento teria de ser elaborada com base nos excertos seleccionados associando documentos que permitissem a análise dos princípios ideológicos fundadores do Estado Novo. Nessa mesma ficha de exploração deveria existir questões que evocassem o filme, por exemplo as questões estatísticas, a posição que Barata, personagem do filme toma, quando denúncia à policia senta-se numa posição mais baixa que o policia, apelar ao significado dessa mensagem, as mensagens que os cartazes transmitem no cortejo etnográfico e no cortejo da comemoração do décimo aniversário da revolução em 28 de Maio, discutir o significado da revolução para o Estado Novo, é idêntica aquela que transparece com o 25 de Abril… deixar questões em aberto para que os discentes reflictam sobre o sentido do filme. Nem todas as questões seriam resolvidas na aula, pois procurar-se-ia desenvolver a competência de comunicação em História para realizarem um comentário, por exemplo ao discurso de Salazar, essas mesmas questões seriam alvo de avaliação quantitativa e não qualitativa, aquando da participação oral dos alunos.

O objectivo do visionamento no 9º ano de escolaridade seria a leccionação mais motivada do conteúdo inicialmente estabelecido.

No 12º ano de escolaridade a exploração passaria por mostrar todo o filme, em aula, pois existe tempo para o efectuar, após a leccionação do conteúdo programático. A realização de uma ficha de visionamento idêntica à anterior, porém mais vocacionada para a explicação das questões e relacionamento dos assuntos, por exemplo, o papel da polícia no controle dos cidadãos; outra vez, a ideia de revolução da década de 30 do Estado Novo e a sua própria ideia; solicitar a pesquisa prévia sobre as personagens históricas que entram no filme, general Óscar Carmona e António de Oliveira Salazar – os argumentistas Baltazar Fernandes (António Lopes Ribeiro) e Jorge Afonso (António Ferro), ocultos por pseudónimos, explicando as razões desse facto; realizar um comentário ao filme tendo por base os argumentos Propaganda – suporte dos regimes autoritários… Perante esta densa exploração suportada pelo filme conclui-se que seria avaliado de forma a reflectir-se na performance dos alunos. O objectivo seria de consolidação de conteúdos, mas com tamanhas tarefas prévias e a seguir ao visionamento suscitar-se-ia mais a construção do saber mais aprofundado sobre a época em questão – o Estado Novo.
























sexta-feira, 26 de junho de 2009

O meu trabalho final foi acerca de... E os vossos?

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A Língua das Borboletas















Título: La Lengua de las Mariposas
País: Espanha
Ano: 1999

Duração: 96 min.
Direcção: José Luis Cuerda
Autoria do Guião: Rafael Azcona, José Luis Cuerda, Manuel Rivas
Actores Principais: Fernando Fernán Gomez no papel de Don Gregorio, o professor, e Manuel Lozano no papel de Moncho, o aluno.
Banda Sonora:
Alejandro Amenábar
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Baseado na Obra: com o mesmo título da autoria de Manuel Rivas, publicado em 1995 no livro de contos “Que me quieres, Amor?”.
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Sinopse: A acção desenrola-se numa pequena povoação galega durante último ano da chamada Segunda República Espanhola. Conta a história de um menino chamado Moncho, a quem chamam carinhosamente de Gorrión – pequeno pardal – inteligente e naturalmente curioso mas tímido e inseguro, que vence um irracional medo de ir à escola, sobretudo pela relação de estreita cumplicidade, respeito e ternura que estabelece com o velho professor, Don Gregorio, um viúvo em final de carreira, republicano convicto, amante da natureza, do conhecimento e da liberdade, fiel à missão de ensinar pelo exemplo, a tolerância e o diálogo.



raquel patriarca


vinteeseis.junho.doismilenove

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Liberdades de Expressão e Informação ou A Diferença Entre Censurar e Manipular

O filme Good Bye Lenin de Wolfgang Becker foi (parece-me), comentado, apreciado e explorado com alguma profundidade durante as duas últimas sessões. A profundidade suficiente para não fazer sentido dizer mais do mesmo. Gostava só de tocar uma questão, abordada no filme, profundamente característica dos regimes políticos ditatoriais: a sonegação das liberdades de expressão e informação.

Partindo da premissa elementar de que um sistema político totalitarista assenta grande parte da sua força no rigoroso controlo da informação, é natural que procure, por um lado, veicular uma versão dos acontecimentos, que é a sua, produzida e propagandeada de forma a atingir objectivos bem definidos e necessários à manutenção do status quo; e pelo outro, impedir que informação não filtrada chegue do exterior, ao mesmo tempo que controla a produção doméstica recorrendo a processos de purga e censura, obrigatórios antes de qualquer divulgação pública.

Parece que foi há muito tempo que Maria Velho da Costa escreveu uma ‘Ova Ortegrafia’, na qual explica que «Ecedi escrever ortado; poupo assim o rabalho a quem me orta...».

Parece que passou muito tempo, sobretudo porque nenhum de nós se pode hoje queixar de dificuldade no acesso à informação, de falta de meios de comunicação, de atropelo à liberdade para dizer, escrever, ler ou ouvir o que entende. Tendo em conta a passagem de um cenário para o outro, a questão que eu gostaria de levantar é a seguinte:

Com tanta informação disponível, estaremos apetrechados da utensilagem mental necessária para fazer a triagem daquilo que é relevante no meio de tanto ruído? Somos senhores da sagacidade, do espírito crítico e da capacidade de análise necessários para perceber em que momentos nos estão a bombardear com determinado assunto para que outro vá passando despercebido? Ou será tudo isto apenas uma nova (e tecnologicamente mais elaborada) estratégia de controlo da informação que consumimos, assimilamos e produzimos?

Não tenho resposta, por isso deixo ficar a pergunta.

Raquel Patriarca

vinteesete.maio.doismilenove

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Goodbye Lenin!

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Goodbye Lenin!

Título: Goodbye Lenin!

Ano: 2003

Duração: 118 minutos

Realizador: Wolfgang Becker

Escrito por: Bernd Lichtenberg e Wolfgang Becker

Actores principais: Daniel Brühl, Katrin Sass, Chulpan Khamatova, Maria Simon, Florian Lukas, Alexander Beyer

.O Filme

Christiane Kerner é uma mulher que vive na República Democrática da Alemanha, sozinha com os seus dois filhos, depois de o seu marido ter fugido para o Ocidente. Com o tempo, decidiu abraçar o socialismo, tendo-se tornada num membro leal e devoto do partido. No dia 7 de Outubro de 1989, após ter visto o seu filho Alex protestar pela liberdade de imprensa, Christiane sofre um ataque cardíaco que a deixa em coma profundo durante oito meses. Quando acorda, o muro de Berlim já não existe. Nem o seu país socialista. Para salvar a mãe, Alex decide ocultar todos os factos políticos, recriando o mundo como era nos 79 metros quadrados do seu apartamento. Realizado por Wolfgang Becker, este filme é a história de um filho que procura o milagre de salvar a sua mãe e fazê-la acreditar que Lenine conseguiu triunfar.

Exploração do filme

O filme desenrola-se na Berlim Oriental, nas vésperas da queda do muro que a separava do Oriente. Vivem-se os últimos dias da Alemanha dividida em duas partes, entre o mundo capitalista do Ocidente e o bloco socialista da RDA. Goodbye Lenine! retrata a transição de uma sociedade cujos bens e produtos obedeciam a regras impostas pelo regime socialista (da roupa às bebidas, dos alimentos aos automóveis), para uma nova sociedade de consumo, livre, das grandes marcas internacionais (Coca-Cola, IKEA, Burger King…).

1. República Democrática Alemã, bloco soviético: os primeiros minutos do filme apresentam alguns dos aspectos da Alemanha de Leste, importantes para que se perceba o clima de repressão e de controlo sobre os cidadãos. Christiane Kerner (minuto 3) é visitada por dois agentes que perguntam por que razão o seu marido viaja tanto para o Ocidente Capitalista, e se estariam a preparar a fuga. Mais adiante no filme, este episódio é recordado por Christiane Heiser (1h27m), que refere que o seu marido sofria pressões no trabalho por não ser do partido. Algumas características deste Estado (minuto 8), de cariz militar, são visíveis durante a celebração do 40º aniversário da DDR – Deutsche Demokratische Republik (República Democrática Alemã). A repressão (minuto 12) surge novamente quando a polícia avança sobre uma manifestação pela liberdade de imprensa, que levou à prisão de Alex Kerner. A vida durante o socialismo surge ao longo do filme, sobretudo por oposição às transformações geradas pela queda do muro de Berlim.

2. Queda do Muro de Berlim, Alemanha unificada: são vários os exemplos de mudança que o filme apresenta, tanto no plano político como social. Logo após as imagens da agitação política, com a demissão de Erich Honecker (secretário-geral do Partido da Unidade Socialista e presidente do Conselho Estatal da RDA – minuto 17), e o fim do regime, com a queda do muro de Berlim, o filme apresenta uma sucessão espantosa de imagens que ilustram a transição da ex-RDA para o capitalismo: as eleições livres (minuto 18), as transformações culturais (vida nocturna, pornografia, músicas alternativas (minuto 23), danças orientais, vestuário), e a introdução de novas marcas e novos hábitos (Coca-Cola, Burger King, instalação de parabólicas – “praticantes da reunificação” (minuto 25) – e a diminuição progressiva do controlo de fronteira). Com o desenrolar do filme, os novos padrões de vida são apresentados em clara antítese com a vida que existia nos 79 metros quadrados do quarto de Christiane Kerner: publicidade no prédio (Coca-Cola), zeppelin, mercado de velharias. Por fim, Goodbye Lenin! é intervalado por sucessivas alusões às transformações económicas: desvalorização da moeda da RDA e a troca pelo marco Alemão do Ocidente; e a diferença do preço dos serviços (43 marcos era o preço da renda na Alemanha de Leste, o equivalente ao preço do serviço de telefone no Ocidente). Um outro aspecto relevante é a fuga de médicos e de pessoas para o lado oposto do muro, e a mudança radical nos bens de consumo (as casas com novas mobílias, as pessoas com roupas diferentes, os carros já não são o convencional Trabant, mas BMW, Mercedes, e outras marcas importadas). Simbolicamente, quando a Alemanha vence o campeonato do mundo de futebol, em 1990, há uma bandeira com o centro cortado, onde outrora estava o símbolo da RDA (1h08m). Em pouco tempo, a vida da RDA socialista desapareceu.

Personagens históricas

- Sigmund Jähn (1937-): o primeiro cosmonauta Alemão
- Erich Honecker (1912-1994): secretário-geral do Partido da Unidade Socialista e presidente do Conselho Estatal da RDA
- Mikhail Gorbachev (1931-): último secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética, e um dos contribuidores para o fim da Guerra Fria
- Helmut Kohl (1930-): chanceler de 1982 até 1998 e um dos responsáveis pela reunificação da Alemanha

Para saber mais
Artigo sobre Goobye Lenin! de Julian Kramer (jornalista de política internacional)
Goodbye Lenin! no IMDB

quinta-feira, 21 de maio de 2009

O Pesadelo de Darwin - análise de Raquel Patriarca

Um Filme Documental Acerca de Homens e Peixes


O Pesadelo de Darwin de Hubert Sauper aparece definido, na primeira linha de pesquisa no Google, como “a documentary film about humans and fish”. Alguém desavisado que leia esta legenda, facilmente entenderá que se trata de um documentário sobre os atentados ambientais que destroem o planeta e que, em última análise, serão responsáveis pelo desaparecimento do que resta da humanidade. Aqueles desavisados que virem o filme, facilmente entenderão que se trata de um documentário sobre as atrocidades que destroem o planeta e que, a muito curto prazo, serão responsáveis pelo desaparecimento do que resta de humanidade dentro de cada um de nós.

A minha primeira reacção foi de deixar passar o tempo, tentar digerir o que vi e só depois analisar e escrever. Cinco dias depois cheguei à conclusão que não vou conseguir digerir nada. Este é, provavelmente, um dos sinais mais seguros de que o filme é muitíssimo bom e que toda a gente o devia ver, pelo menos uma vez. O problema é que qualquer reflexão que eu possa fazer é, à partida, tolhida pelo desconforto, o desalento e a revolta. Por outro lado, um filme tão brutalmente objectivo e esclarecedor não deixa grande margem para interpretação.

Vou apenas enunciar, o mais telegraficamente possível, três aspectos que me parecem dignos de nota: o primeiro toca questões formais; o segundo toca questões de conteúdo; o terceiro não sei dizer que questões toca.
Primeiro: O filme é bem conseguido por ser um documentário sem comentários. A esmagadora maioria dos filmes ou séries ditos documentais que vemos hoje estão carregados de comentários, relatos e explicações que, as mais das vezes, servem um de três objectivos: transformar o documentário em algo altamente empolgante e cheio de suspense; encaminhar a narração dos factos relatados segundo uma interpretação pré-concebida; fazer do documentarista o herói explorador do desconhecido ou reparador de injustiças. Este documentário é extremamente poupado nas informações que oferece em paralelo com o filme, e os poucos elementos que dá são puramente factuais: o nome e a profissão da pessoa que aparece a dar o seu testemunho; a data de um acontecimento específico ou a identificação de um determinado local.
Segundo: É incrível e abismal a diferença entre o discurso dos tanzanianos e o discurso dos outros – os russos, por exemplo. Excepção feita ao pastor – que deixa um testemunho por demais familiar –, qualquer criança de rua ou desempregado de esquina é capaz de fazer uma análise apurada da economia mundial, uma explicação integrada e estratégica do papel do continente africano na dinâmica geopolítica global e articular uma opinião informada sobre aquilo que lhe é perguntado. Pode não ter razão no que diz – isso não está aqui em causa – o que é de reter é a clareza, abertura e objectividade com que cada um partilha aquilo que observa, que sabe e pensa. De si próprio, dos outros, da morte, da vida, da doença, da religião, da guerra, do rio, do peixe, do banco mundial, de tudo. Os outros – os não nativos de países de terceiro mundo – são ridiculamente evasivos, comprometidamente neutros e mentirosamente ignorantes.
Terceiro: O Pesadelo de Darwin, como metáfora para a ‘desevolução’ da raça humana, é um título extraordinariamente bem escolhido para um filme que bem pode ser o exemplo mais acabado da ideia que define a realidade como incomensuravelmente pior que qualquer espécie de ficção.

Noutra das pesquisas que fiz no Google à procura de informação sobre a Tanzânia, encontrei um site turístico decorado com fotografias lindíssimas e no fundo, como um slogan publicitário, pode ler-se a frase: “the authentic Africa”… parece-me agora um conceito aterrador.


Raquel
vinte.maio.doismilenove

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Recursos na rede

1. INTERNET MOVIE DATABASE


+ Base de dados de todos os filmes mundiais, em que apresenta os dados técnicos, uma sinopse e detalhes pormenorizados do filme; dispõe de uma secção de falhas dos filmes (goofs), relevante para se saber, em pouco tempo, quais os anacronismos e erros históricos. Site fundamental para a preparação de um filme.

- A busca tem de ser feita sempre em Inglês, e é necessário utilizar termos de pesquisa muito específicos.

2. FILM & HISTORY
+ Índice de alguns filmes de história Americana.

- Links quebrados e demasiado na História da América.

3. HISTORY CHANNEL
+ Vídeos temáticos, com especial enfoque nas guerras mundiais.

- A imensa variedade de temas acaba por se tornar inútil, porque entra na história fantástica.

4. ACADEMIC INFO
+ Índice alfabético de recursos educacionais disponíveis na rede. Serve para encontrar ligações relevantes para a História e Cinema, mas também para outras áreas do saber.

- Nem todas as ligações são relevantes. Perde-se imenso tempo a descobrir um site realmente útil.

5. WAR AND WAR-ERA MOVIES
+ Lista de filmes sobre a guerra.

- Exceptuando as batalhas Americanas, é sobretudo sobre confrontos militares do século XX.

6. VIRTUAL LIBRARY - FILM HISTORY INDEX
+ Ligações a sites nacionais úteis, com informações históricas sobre os filmes e realizadores.

- Não é um site fácil de navegar, pela construção demasiado minimalista. Deveria conter informações mais pormenorizadas sobre as ligações.

7. PROJECT MUSE - FILM HISTORY
+ Journal of Film History: artigos sobre o Cinema e a História

- Geralmente, são artigos demasiado técnicos.

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O YouTube também fez parte da última sessão. As ligações seguintes correspondem aos vídeos visionados.



1. Flappers: The Roaring Twenties

2. The Charleston

3. To live in the 1920s

4. The 1929 Stock Market Crash news footage

5. A Artilharia Portuguesa de meados do século XV e XVI

6. O Regicídio

7. Início da Guerra Colonial

8. Guerra do Ultramar

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Não se esqueçam de ver os vídeos relacionados, do lado direito do ecrã.

Bons vídeos e boas aulas!

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Arca Russa - análise de Raquel Patriarca

Trezentos Anos de História em Noventa e Seis Minutos


A Arca Russa de Aleksandr Sokurov passou a fazer parte dos filmes mais notáveis que vi, e isto é válido tanto no que toca aos aspectos formais, como às questões de conteúdo.

Os desafios técnicos do projecto em si são, logo à partida, factores determinantes. A enormidade do elenco, a solenidade do cenário, a presença de inúmeras obras de arte do museu e a introdução das orquestras e do teatro, a beleza do guarda-roupa, da música, da dança, o acaso das conversas não acabadas, o entreabrir de portas que é o espreitar o passado que não se compreende na totalidade, tudo magistralmente coordenado numa coreografia perfeita, transporta-nos no tempo e no espaço e produz, num só fôlego de hora e meia, uma viagem e uma experiência únicas.

Em relação ao tema e ao conteúdo não vou refazer a análise e problematização apresentadas pelo André Vitória – até porque não saberia como – mas gostava, ainda assim, de partilhar um ou dois pontos que me têm provocado algumas sinapses…

Aquilo que mais me fascinou foi a estratégia escolhida pelo realizador para contar a sua história e provocar o efeito – muito bem conseguido, diga-se – de nos fazer reflectir sobre questões do passado que são actuais no presente.
Quanto mais penso nisso, mais brilhante me parece a ideia de colocar um homem de hoje, com o conhecimento e horizonte históricos que temos – hoje – em diálogo com um homem do passado, que assistiu, participou e escreveu sobre esse passado, ambos envolvidos numa tentativa de orientação mútua por entre os meandros da passagem do tempo, com escalas em vários momentos – uns puramente circunstanciais, outros de manifesta importância histórica.

É como se fosse uma forma relativamente simples – mas não simplista – de colocar questões muito complexas; como a identidade cultural da Rússia ou as razões e circunstâncias que possam ter determinado o seu percurso histórico dos últimos séculos. E não é só o colocar das questões é o colocá-las tanto pelo homem de então como pelo homem actual.

O Marquês de Custine, muito participante e opinativo, assiste a acontecimentos próprios do seu tempo que analisa de um ponto de vista externo, porque não é russo mas ‘estrangeiro’ ou ‘europeu’ e acaba por passar de uma postura crítica da sociedade russa para uma posição de identificação cúmplice e admiração genuína. Ele conhece aquilo a que podemos chamar de antecedentes da Revolução Russa.
O Realizador do séc. XXI, que interage apenas com o Marquês, vê tudo com a estranheza e incompreensão próprias de quem está a ver um mundo diferente do seu, é – ao contrário do anterior – um russo e portanto tudo o aquilo a que assiste é, também, o seu passado, a sua herança histórica, independentemente da forma como se identifica com ela ou não. Coloca muitas questões, ajuda a esclarecer outras e assume a posição de quem sabe o que se segue à queda do Império e sobretudo o de quem conhece as consequências da Revolução Russa.

Os dois observadores, que nada têm em comum e que apresentam perspectivas diferentes perante tudo aquilo que vêm ao longo do filme são, de alguma forma, complementares nos pontos de vista e, mais importante ainda, sobrepostos nas dúvidas acerca do futuro da Rússia, que aparecem colocadas de uma maneira mais ou menos metafórica no final, e que o realizador parece relançar hoje.

Penso que esta fórmula de ‘ensinar’ a história através de um filme, sem a reduzir a uma visão linear de interpretação única, sem levantar problemas ou dúvidas, é cognitivamente mais estimulante e intelectualmente mais honesta que a esmagadora maioria dos filmes que seriam, para mim, escolhas mais evidentes. Finamente considero que tratar (ver, discutir, analisar, explorar, etc.) filmes considerados mais ‘difíceis’ ou problemáticos – e ainda que depois, em ambiente de aula com alunos mais novos, se opte por outras soluções – considero, dizia eu, que esta é a melhor estratégia para nos tornar aptos a fazer esse tratamento, sozinhos e sobre qualquer tipo e espécie de filme.


Raquel Patriarca
17.maio.2009